quinta-feira, 28 de agosto de 2008

HOMENS E ALGAS - OTHON D´EÇA



HOMENS E ALGAS de OTHON D´EÇA

Othon d’Eça (1892-1956) nasceu na antiga Desterro (hoje, Florianópolis), Ilha de Santa Catarina. Ao contrário de Virgílio Várzea, que conviveu com o mar, Othon d’Eça viu o mar através dos pescadores, sua vida amarga, seus cansaços estéreis e aquele modo conformado de encarar o destino.
Marinhista, falou do mar retratado nos saberes, no olhar e na alma do homem do litoral. Nas vivências e nas convivências ouviu-lhes histórias e lamentos, festejou a pesca farta, chorou a perda do ente querido, testemunhou a pobreza resignada. “De alguns ouvi-lhes contar os perigos do mar alto, quando o vento sul, cheio de uivos e ameaças, levanta muros de água negra, e os filhos que morrem pequeninos, queimados pela sezão ou esvaídos em sangue, e as fomes que suportaram, numa cova de praia, no rancho sem esperança e sem lumes.”, escreveu em Homens e algas.
Diante da paisagem ilhoa e praieira, não escondia seu êxtase, fazendo da pena o pincel, e das palavras a pintura desse cenário mítico.
Assim como debruçou-se na descrição artística da paisagem, no minucioso registro do "modus vivendi" do pescador, assim, também, foi um manejador exímio da palavra escrita, aproximando a linguagem popular da literária em que tanto os personagens como o narrador se exprimem no mesmo linguajar.
Seu primeiro livro, Cinza e bruma, editado em 1918, no Rio de Janeiro, lembrava o poeta simbolista Cruz e Sousa do Missal. Essa influência de duração efêmera não deixou marcas em sua carreira literária. Em 1920 criou a Sociedade Literária Catarinense de Letras que, em 1924, passaria a denominar-se Academia Catarinense de Letras, instituição da maior relevância no desenvolvimento da literatura catarinense.
Seguem-se a novela Vindita braba (publicada em 1923 no jornal “A República”, de Florianópolis, e no ano de 1924 na “Revista do Brasil’, de São Paulo, por iniciativa do escritor Monteiro Lobato), Aos espanhóis confinantes (1929), Nuestra Señora de L'Asunción (inédito até 1992) e Homens e algas (1ª edição, 1957), sem dúvida o livro mais importante.
Em Homens e algas, seu último livro, a ficção e a realidade se encontram numa coletânea de histórias curtas, vincadas pelo vivo contraste entre o cotidiano sofrido, miserável, desesperançado e os tons coloridos da paisagem exuberante. Para Othon d’Eça, Homens e algas, como ele afirma em seu ‘Como um prefácio’, é quase um livro de memórias "escrito com o intuito de gravar verdades vivas e amargas - que valem muito mais que os relevos dos frisos e as galas da imaginação".
Vemos, todavia, que ao fixar tipos humanos, linguagem, folclore e vida praieira, Othon d’Eça, além de produzir uma vigorosa literatura regional etnográfica, em todo o seu texto carregado de açorianismos, traz à tona a memória coletiva de uma população desvalida. Logo, sua obra é mais que um livro de memórias, é uma peça documental preciosa pelo registro que faz da nossa história social e cultural.
Nos contos narrados com simplicidade e originalidade Othon d’Eça dá voz à criaturas cuja vida se desenrola junto aos avanços e recuos do mar, sobre a praia, numa relação simbiótica, “homens e algas cuspidos todos numa praia, sob o sol dourado e vivo: as algas pelo mar e os homens pela miséria”.
LÉLIA PEREIRA DA SILVA NUNES - Presença açoriana na literatura da Ilha de Santa Catarina

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